Como fazer uma propaganda criativa a fim de chamar a atenção das pessoas, num tempo de mídias digitais, avalanche de informações vindas de todos os cantos e atenções dispersas? Dia desses, assistindo à TV, me chamou a atenção o anúncio de um carro da Toyota, o modelo Hylux 2010 - "Hylux Invencível". Gostaria aqui de fazer um breve comentário sobre o comercial, cuja história foi inspirada num fato real acontecido no Brasil do século passado: uma época sem internet, sem televisão, e no qual a mídia mais poderosa era o rádio.
Dê uma olhada no comercial abaixo. Um homem, pilotando um pequeno avião (daqueles que, até bem pouco tempo, chamaríamos de teco-teco), enfrenta uma grande tempestade. Ele deseja aterrisar, mas não há nenhum aeroporto à vista. O que fazer? Ele faz contato com alguém, que imediatamente aciona um grupo de ajudantes - todos eles dirigindo o tal "Hylux invencível". As cenas seguintes mostram os carros desbravando um território irregular (sim, para chegar ao local que desejam, eles não dirigem por estradas convencionais, mas por morros e descampados). Enfim, chegam a um local no qual, enfileirados, deixam os faróis ligados. Do céu, o piloto consegue ver a iluminação deixada pelos carros e consegue aterrisar no local, seguido de grande comemoração. Slogan da publicidade: "Você não sabia que uma pick-up poderia percorrer tantos caminhos".
Corta para a década de 1940. O rádio vivia sua era de ouro. No começo da década, o governo Vargas emcampa a Rádio Nacional, o primeiro veículo com um grande poder de penetração em todas as grandes regiões brasileiras. Era a "TV Globo" da época. Seu poder e alcance seria posto à prova numa noite, na qual um avião da Força Aérea Brasileira - um Boeing b-17 - depois de cruzar a Floresta Amazônica com 14 pessoas, viu-se sem conseguir pousar no aeroporto de Campo Grande, devido à queda de energia no local. Alertado sobre o drama do avião sem local para pousar, um oficial da base aérea de Santa Cruz, no Rio de Janeiro, telefona para a Rádio Nacional e pede que o locutor transmita uma mensagem aos moradores da região:
"Atenção, Campo Grande! Atenção, Campo Grande, em Mato Grosso! Uma fortaleza voadora da FAB precisa aterrisar, mas o campo de pouso está às escuras. Os moradores da cidade devem ir com seus automóveis para o aeroporto a fim de iluminarem as pistas de pouso com seus faróis."
Aquele pedido, feito no estúdio da Rádio Nacional, no Rio de Janeiro, atravessou as regiões e chegou aos moradores de Campo Grande, que acataram o pedido. Apenas meia hora depois, o Boeing da Força Aérea conseguiu pousar em uma pista do aeroporto, iluminada por faróis de dezenas de automóveis.
Obviamente não eram todos utilitários como o modelo da Toyota. Estávamos na década de 1940, lembram? Com certeza a maioria dos motoristas que ouviu o locutor pelas ondas do rádio também não precisou subir montes e caminhos inóspitos para chegar ao local, preferindo pegar a rodovia local. Essas liberdades poéticas só estão no anúncio da Toyota e no mundo da publicidade. O caso real de Campo Grande, porém, virou lenda e foi contado de pai pra filho nas décadas posteriores (a história pode ser conferida no livro Rádio - veículo, história e técnica, de Luiz Carlos Ferrareto). Até chegar certamente aos ouvidos de um publicitário no ano de 2010, que utilizou o fato como inspiração para um criativo comercial.
Duas lições ficam para quem se interessa por comunicação: primeiro, que tenham ciência do grande poder de penetração do rádio na primeira metade do século XX. Segundo, que boas histórias - ainda que aumentadas ou "distorcidas" para conseguir um resultado mais sedutor -, serão sempre fortes componentes para a indústria da propaganda e o entretenimento.
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