Sábado, 19 de dezembro, 16 horas. Em toda a cidade do Rio de Janeiro uma multidão se esforça para realizar as últimas compras de Natal. Paro e reflito: o que faz um pai separado, que naquele dia exato se encontra com filho e afilhado, ávidos por diversão e aventura? Vai ao shopping? Não!!! Embrenha-se no Mercadão de Madureira ou ao Saara? Nem pensar - seria muita tortura para os pequenos. Uma dica preciosa surge no sábado pela manhã: o concerto "Villa in Concert", com a Orquestra Villa-Lobos e as Crianças, no belo espaço ao ar livre do Arquivo Nacional. Ali, jovens de várias comunidades cariocas se encontram para tocar e encantar a plateia com músicas para crianças compostas pelo maestro Heitor Villa-Lobos. Se valeu a pena? Bem, continue lendo.
Chegamos cedo ao local. Depois de uma manhã chuvosa na qual tudo parecia desandar, felizmente o sol se abriu no começo da tarde. Enquanto membros da orquestra afinavam os instrumentos e esperavam o público chegar, conferimos a exposição Viva Villa!, que contextualiza a vida e a obra de Heitor Villa Lobos, desde seu nascimento, no final do século XIX, até a morte. Objetos pessoais do maestro, partituras das Bachianas Brasileiras, uma reprodução fiel do ambiente de composição de Villa, está tudo lá. Chama a atenção um imenso mural com a foto de mais de 40 mil pessoas - estudantes, professores e músicos - no estádio de São Januário, sendo regidos num canto de coro orfeônico por Villa Lobos na década de 1940. Digo ao Arthur, meu filho, que aquele é o estádio do Vasco, o time do papai. Ele pergunta por que não foi no estádio do Fluminense, time pelo qual torce, e eu dou um sorriso. Explico que na época não havia nem o Maracanã, e o estádio do Vasco era então um dos maiores do Brasil. Villa sonhava em ver todas as crianças brasileiras aprendendo música nas escolas, e a notícia recente de que as aulas de música serão obrigatórias nos próximos anos é algo animador. Ouvir música é ótimo; conhecer música é ainda melhor.
Mas o que encanta mesmo os pequenos é o segundo segmento da exposição, intitulado "Trenzinho Caipira". Ali, numa adorável atmosfera lúdica, caminhamos por dentro de vagões cenográficos, ambientados a partir de passagens da vida do maestro. As crianças conferem as imagens projetadas pelas janelas do trem - como em pequenos cineminhas, somos brindados com cenas do universo musical do maestro e dos lugares em que eles esteve - Sertão, Paris, Brasil, Amazônia e Nova York. Villa era um cidadão do mundo, e as poltronas e projeções dos vagões daquele trenzinho adorável nos levaram, ainda que por alguns minutos, a embarcar nesta viagem.
Chega o grande momento. A Orquestra já está a postos. Meu filho quer água. O outro pede pra ir ao banheiro. Não dá pra ser depois? Correria. Mas dá tempo pra fazer tudo e ainda achar lugares vagos (azar de quem preferiu as compras de última hora...rs). As crianças ainda ganham pipas com a inscrição Viva Villa e ficam contentes.
À frente dos jovens, o maestro Sergio Barboza dá início aos trabalhos. Há ali crianças de São João de Meriti, Belford Roxo, Nova Iguaçu, São Gonçalo, Santa Tereza, Morro Dona Marta etc. Talentos que o Projeto Villa-Lobos foi buscar em toda a região metropolitana do Rio de Janeiro.
Ao longo da apresentação, diversos clásicos são levados ao público: "Cantar pra viver", "O Trenzinho do Caipira", "Pastorzinho-Bela Pastora", "O Cravo Brigou com a Rosa", "O Canto do Pajé" e muitas outras. O maestro alterna a regência com momentos em que conta à plateia histórias das composições e dos ritmos colhidos por Villa em suas andanças pelo Brasil. Somos brindados com baião, samba, frevo e até um pequeno momento de funk carioca em meio aos clássicos. Villa provou e sorveu de inúmeros ritmos populares brasileiros. Como o maestro conta, quando bem usados, todos os ritmos servem à fruição musical.
Enquanto os mais velhos ouvem respeitosamente as músicas (alguns, é verdade, viram crianças, batem palmas, cantam junto e pedem bis), as crianças menores - algumas, como é o caso do meu filho, afilhado e sobrinha, todos assistindo pela primeira vez a um concerto -, reagem entre a curiosidade, o encanto e a dispersão. Arthur, com 4 anos, faz perguntas sobre os instrumentos ("qual é aquele grandão no colo da garota, papai?", sobre o viooloncelo), assiste com atenção ao "Trenzinho", mas no meio do show já está correndo com a prima de 2 anos, Juju, nos arredores do belo jardim do Arquivo Nacional. O afilhado, com 8 anos, dispensa a correria e assiste até o fim.
No final, ainda sobra tempo para ouvirmos Pixinguinha, Guerra-Peixe e Tom Jobim. E o bis traz "Vassourinha" e "O Canto do Pajé".
Saímos satisfeitos e felizes do Arquivo Nacional, com a certeza de uma ótima tarde de dezembro. Foi a primeira vez que meu filho entrou em contato com a música de Villa Lobos, e fico contente. No carro, minha irmã pergunta a ele se gostou do concerto. "Gostei, mas gostei mais de correr com a Juju nos jardins!!"
Bem, pra uma primeira vez, tenho certeza de que valeu a pena. Arthur está sintonizado com a época. Realmente dezembro é um mês de correria, não é mesmo?
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