Foi um ano que passou muito rápido, mas com vários momentos marcantes, Um ano de Copa do Mundo em que as torcidas do Brasil e do mundo inteiro deram show, enquanto nosso time dava vexame contra a Alemanha. Um ano de eleições para presidente em que preponderou o baixo nível das acusações entre candidatos na televisão e seus eleitores nas redes sociais, estas novas esferas públicas onde qualquer um pode publicar opiniões. Os ânimos estiveram exaltados e vários "amigos" foram jogados pra escanteio no Facebook, apenas porque declararam seu voto em Dilma ou Aécio. Houve a novidade dos debates na televisão onde a figura do jornalista foi devidamente defenestrada - uma estratégia malandra das TVs, quando o embate entre adversários ganhou em drama mas perdeu em conteúdo. O resultado foi uma ida às urnas com a sociedade hiperpolarizada e sem conhecer de fato as propostas dos dois principais candidatos.
Mas deixemos as eleições para trás e pensemos na nossa sociedade digitalizada. Houve um momento nas copas anteriores em que era fácil encontrar um identificar um torcedor japonês: era aquele que estava tirando várias fotos dentro dos estádios, sem se preocupar como rolo de negativos. Negativos?! Isso ficou devidamente no passado com as câmeras digitais e os smartphones com câmeras cada vez melhores. Logo surgiriam os autorretratos ou "selfies" (a palavra do ano de 2013, segundo o dicionário Oxford). Tira-se foto de tudo, da nova roupa comprada para a festinha até de pratos com comida em restaurantes (argh!!). Viramos todos japoneses? Ou foi a sociedade que ficou mais egocêntrica? Há indícios para apostar na segunda hipótese.
2014 foi, entre tantos fatos relevantes e irrelevantes, o ano do aparecimento no Brasil, ainda na Copa do Mundo, do famigerado "pau de selfie", ou "Go Pobre" (sutil adaptação da caríssima câmera de selfies Go Pro). O pau de selfie (um bastão para fazer autorretatos, que pode chegar a até 1m) foi visto pela primeira vez como uma bizarrice nas arquibancadas dos estádios (perdão, arenas) brasileiros da Copa, trazidos por integrantes de torcidas estrangeiras. Muitos pensaram ser algo restrito á Copa, como as vuvuzelas da África do Sul, mas estavam enganados. Na semana passada, vi na praia em Arraial do Cabo, aqui no Rio, pelo menos duas pessoas usando o objeto. Entrei na internet intrigado e lá estava a manchete: "Às vésperas do Natal, procura por 'pau de selfie' aumenta". Isso diz muito de uma sociedade cada vez mais vítima do narcisismo eletrônico, onde a popularidade é marcada pelo número de "curtidas" em redes sociais. Sinal dos tempos.
Enquanto os selfies proliferam, eu aqui aproveito para compartilhar com vocês um pouco do que assisti, li e ouvi de bom em 2014. Claro que o tempo dividido pelo trabalho entre duas faculdades de Comunicação não deixou que eu aproveitasse ao máximo as opções culturais. Segue abaixo,portanto, uma lista curta e bastante pessoal, apenas para alimentar este blog no qual tão pouco publiquei nos últimos meses.
No cinema, o ano começou bem com o sensacional "O lobo de Wall Street", de Martins Scorsese, com uma atuação espetacular de Leonardo DiCaprio. Tivesse ele uma meia hora a menos, seria uma obra-prima. Ainda no primeiro semestre, o belo e pungente "Ela", de Spíke Jonze, com Joaquin Phoenix, a história de um homem solitário que se apaixona por um sistema operacional de computador com a voz de Scarlett Johanssen. Uma bela reflexão sobre a dependência tecnológica e o amor em tempos digitais.
Mais para o fim do ano, dois grandes filmes. Primeiro, "Boyhood - da infância à juventude", no qual o diretor Richard Linklater promove uma experiência única na história do cinema: acompanhar a vida de um menino dos 6 aos 18 anos. Mais que o prazer de acompanhar uma filmagem com a mesma equipe que levou 12 anos (coisa rara em tempos onde tudo é efêmero) o filme ainda discute a passagem do tempo e como ele nos afeta. E entre aqueles filmes que suscitaram discussões na saída dos cinemas está o genial 'Relatos selvagcens", filme argentino em episódios sobre indivíduos comuns confrontados com situações alarmantes ou até desesperadoras. Em geral, contamos até 10 e seguimos em frente. Em, "Relatos", os personagens enfrentam o inesperado, com consequências atordoantes.
Na televisão, duas ótimas minisséries na Globo: "Amores roubados" e "Dupla identidade". E uma ótima surpresa, o programa de humor "Tá no ar: a TV na TV", uma ideia da dupla Marcius Melhen e Marcelo Adnet em que o tema mais satirizado é a própria TV, seus programas e formatos. Uma ótima curtição metalinguística, com quadros que fizeram sucesso e que teve o mérito de finalmente mostrar o talento de Adnet na Globo.
No teatro, ótimas peças em reapresentações, Finalmente consegui assistir a "Arte", da israelense Yasmina Reza (mesma autora de "O deus da carnificina"), e dois musicais inspirados em grandes nomes da cultura e comunicação brasileiras: "Elis, a musical" e "Chacrinha". Este último, principalmente no segundo ato, quando a peça vira um show de auditório do Chacrinha, é uma das mais divertidas peças a que assisti nos últimos tempos, capturando bem o espírito anárquico e debochado do velho guerreiro.
Mas não posso esquecer do espetáculo em que estive com meu filho, na longínqua Cidade das Artes: "Os saltimbancos trapalhões", Pensando bem, não tinha como dar errado: a competência técnica da dupla Muller e Botelho, os atores, dançarinos e cantores escolhidos a dedo; as músicas de Chico Buarque que marcaram toda uma geração; e o talento de Renato Aragão pela primeira vez no palco de um teatro, acompanhado por Dedé Santana. Não foram poucos os adultos com lágrimas nos olhos nas cenas em que Renato estava presente.e roubando a cena. Ao final, a constatação de que o teatro musical brasileiro se encontra hoje entre os melhores do mundo.
Amanhã, segue o que curti de bom na música e na literatura.
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