quarta-feira, 30 de setembro de 2009

O rádio em nossas vidas

Não posso mais viver assim do seu ladinho
Por isso colo meu ouvido no radinho de pilha
Pra te sintonizar
Sozinha...numa ilha

(Sonífera ilha, Titãs)


Sexta passada comemorou-se o dia do rádio. Mesmo atrasado, este blog não poderia deixar de falar um pouco sobre este veículo de comunicação tão importante. "Alguém ainda ouve rádio?", poderia logo perguntar algum apressadinho amante das chamadas "novas mídias", entre elas esta internet a qual você se debruça neste momento, caro leitor.

Ora ora, eu respondo que sim, o rádio está vivo e não vai acabar - apenas irá se reinventar e segmentar sua programação a fim de atingir um novo público. Exemplo claro desta reinvenção são as inúmeras rádios online aqui no território da internet - agora, além de agregarem ao som digital imagens, podcasts e interatividade (em muitas emissoras você pode montar sua programação particular), há a vantagem de podermos escutar nossa rádio preferida em qualquer lugar do mundo.

Pessoas em todos os lugares escutam diariamente as rádios e suas programações. Assim como os jornais impressos (outro meio de comunicação visto pelos apocalípticos de plantão como um meio fadado à extinção), os rádios tiveram sua época áurea, e na primeira metade do século XX foram com certeza - junto com o cinema - o maior veículo de entretenimento das grandes massas. Nos anos 1930, o rádio era sinônimo de espetáculo: era diante de um grande aparelho valvulado, ou seja, um rádio, que as famílias se reuniam, na sala, antes do advento da televisão. Era na rádio que os artistas de maior prestígio surgiam, que os cantores de maior sucesso atuavam, que os programas de auditório e novelas arrebanhavam multidões de ouvintes.

Um fato real do poder de fogo do rádio nesta época aconteceu nos Estados Unidos, mais precisamentre a partir das nove horas da noite de 1938. Foi nesse momento que os americanos começaram a ouvir a transmisão radiofônica da obra "A Guerra dos Mundos", do escritor H.G.Wells. A obra tratava de uma fictícia invasão da Terra por marcianos, mas o condutor do programa e adaptador da obra - um jovem e já genial Orson Welles - levou ao ar uma obra em formato jornalístico, como se a invasão estivesse realmente acontecendo. Foi o bastante para levar milhares de pessoas ao desespero, como mostra este trecho do artigo de Giusela Ortriwano, do livro "Rádio e Pânico":

Todas as características do radiojornalismo usadas na época – às quais os ouvintes estavam habituados e nas quais acreditavam – se faziam presentes: reportagens externas, entrevistas com testemunhas que estariam vivenciando o acontecimento, opiniões de especialistas e autoridades, efeitos sonoros, sons ambientes, gritos, a emotividade dos envolvidos, inclusive dos pretensos repórteres e comentaristas, davam a impressão de um fato, que estava indo ao ar em edição extraordinária, interrompendo outro programa, o radioteatro previsto. Na realidade, tratava-se do 17º programa da série semanal de adaptações radiofônicas realizadas por Orson Welles e o Radioteatro Mercury que explorava as técnicas jornalísticas com a ambientação sonora requerida pela linguagem específica do rádio.
A CBS calculou na época que o programa foi ouvido por cerca de seis milhões de pessoas, das quais metade passaram a sintonizá-lo quando já havia começado, perdendo a introdução que informava tratar-se do radioteatro semanal. Pelo menos 1,2 milhão tomaram a dramatização como fato, acreditando que estavam mesmo acompanhando uma reportagem extraordinária. E, desses, meio milhão tiveram certeza de que o perigo era iminente, entrando em pânico e agindo de forma a confirmar os fatos que estavam sendo narrados: sobrecarga de linhas telefônicas interrompendo realmente as comunicações, aglomerações nas ruas, congestionamentos de trânsito provocados por ouvintes apavorados tentando fugir do perigo que lhes parecia real, etc. O medo paralisou três cidades. Pânico ocorreu principalmente em localidades próximas a Nova Jersey, de onde a CBS emitia e Welles situou sua história. Houve fuga em massa e reações desesperadas de moradores de Newark e Nova York (além de Nova Jersey), que sofreram a invasão virtual dos marcianos da história.


O episódio, até hoje lembrado e discutido por estudiosos da Comunicação, marcou o apogeu do rádio e seu poder de influência. A partir de então políticos, homens de marketing e publicitários viram que estavam diante de um instrumento que poderia influenciar milhões, e não por acaso o rádio foi bastante usado como máquina de propaganda nos anos anteriores e durante a Segunda Guerra, tanto por nazistas como aliados, os dois lados em guerra dispostos a manipular corações e mentes em prol de uma ideologia vencedora.

A história mostra que a chegada de uma nova mídia não necessariamente implica no fim das anteriores. Com a chegada da televisão, o rádio perde seu apogeu e poder de influência. O baque foi profundo, mas ele se reinventou escorando-se no tripé jornalismo/prestação de serviços, esportes e entretenimento - este último representado pela música gravada, já que, como a transferência das verbas publicitárias para a televisão, as rádios perderam seus fabulosos castings, atraídos agora pelos programas de auditório televisivos, que pagavam melhor. A partir de então, o veículo teve que investir na segmentação, reformulando suas programações para atingir cada público-alvo em particular, tornando-se quase um "amigo íntimo" de quem estava em casa ou no trabalho - até hoje o rádio e seus locutores são a única companhia de milhares de solitários mundo afora, que abrandam a solidão ao escutar seus programas favoritos.

Hoje temos rádios com as mais diversas linhas de programação, Há desde as emissoras em FM cujo foco é a música, até aquelas que se propõem a levar uma programação 24 horas de notícias, também chamadas de "all news". Pra quem duvida do poder de influência das rádios, elas ainda hoje são bastante procuradas por políticos interessados num "upgrade" em suas carreiras, e há muitas emissoras cujos donos são deputados e senadores, que utilizam o espaço no dial como uma espécie de palanque eletrônico. Há também as inúmeras rádios arrendadas por igrejas evangélicas na busca midiática pelo aumento dos fiéis. Tudo isto só comprova que as ondas sonoras do rádio ainda estão vivas e fortes junto à população.

Marginal conservador aproveitará este tema tão rico para tecer em outros artigos comentários sobre a programação radiofônica, assim como alguns programas em especial. Quem gosta de ouvir rádio, deixo um recado no estilo dos bons locutores: fique ligado!

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Cê tá pensando que eu sou Loki, bicho?

É hoje! pra quem perdeu nos cinemas, estreia logo mais no Canal Brasil o longa-metragem "Loki", biogragia cinematográfica de um dos maiores músicos brasileiros, o ex-mutante Arnaldo Batista.

O filme, dirigido pelo cineasta Paulo Henrique Fontenelle, é o primeiro a ser produzido pelo Canal Brasil e já ganhou vários prêmios nacionais e internacionais, conquistando nos festivais do Rio e de São Paulo os prêmios do Jurí Popular e o de melhor documentário no Festival de Nova York. Kurt Cobain, que aparece no filme declarando sua paixão pelos Mutantes, se vivo estivesse, adoraria ter conferido a sessão.

Marginal conservador é fã de Arnaldo Batista e dos Mutantes. Vale a pena conferir a vida deste grande talento, desde a infância em São Paulo, o sucesso arrasador com os Mutantes - ainda hoje a banda mais revolucionária do rock brasileiro - a parceria com a ex-mulher Rita Lee, os períodos de ostracismo e barra-pesada (causado por drogas e a depressão que o levou a tentativas de suicídio e internações em sanatórios), até a volta por cima; o reencontro com o irmão mutante Sérgio Dias, a apoteose da volta do grupo em Londres e os dias atuais em Juiz de Fora. É lá que o músico preenche os dias com sua nova paixão, a pintura, e planeja novos voos solo. Longa vida a este ser eternamente inquieto e mutante.

quarta-feira, 16 de setembro de 2009

A censura apresenta suas armas: sites jornalísticos, blogs e imprensa sob vigilância e intimidações

"Entre sem bater". Pouca gente sabe que a protocolar frase estampada à frente de centenas de portas de repartições públicas e escritórios Brasil afora foi na verdade inventada pelo Barão de Itararé, pseudônimo de Aparício Torelly, genial jornalista e humorista, vereador e provocador profissional. Conta-se que em 1934, após publicar em fascículos a saga do marinheiro João Cândido e sua Revolta da Chibata, Torelly recebeu na redação de seu jornal a visita indesejada de um grupo (nunca identificado), que lhe teria aplicado uma bela surra, revoltado com a apologia ao almirante negro. Dias depois, já recuperado, o Barão afixava o lembrete irônico à porta de seu escritório.

Passaram-se as décadas e a imprensa livre continua incomodando aqueles que estão no poder, que gostariam mesmo é de vê-la domesticada, sem denúncias, sem fiscalizar os poderes, sem a busca incessante da verdade para auxiliar na construção da opinião pública. Ideologias de direita ou esquerda, ditaduras ou governos autoritários travestidos de democracias, todos eles têm em comum a intenção de cooptar, controlar ou calar os meios de comunicação. Alguns exemplos recentes tem tido destaque na mídia, como a tentativa de controlar a campanha eleitoral no meio online. Ora, definitivamente a classe política brasileira não parece compreender a internet como um território livre.

Como diria o Barão, há alguma coisa no ar, além dos aviões de carreira. Depois de muitas idas e vindas, a Câmara dos Deputados recuou de seu primeiro projeto de reforma eleitoral - que liberava totalmente o debate político no ambiente virtual - e seguiu as modificações aprovadas pelo Senado na noite de terça-feira, dia 15/09. A partir de agora, mesmo não sendo, como os rádios e as TVs, concessões públicas, veículos de comunicação social na internet terão de seguir as mesmas regras de debate aplicadas à TV e ao rádio. Ou seja, quebra-se a autonomia da empresa de comunicação que possui um site em decidir qual candidato participará de alguma entrevista online - ela deverá chamar ao menos dois terços dos candidatos para participar de debates eleitorais, sob pena de multa ou ter o site tirado do ar.

A Câmara manteve a liberdade de blogs, redes sociais, sites e programas de mensagens instantâneas (até o msn neguinho quer vigiar!), mas com ressalvas. Ressalvas um tanto inusitadas: o direito democrático de cada blogueiro em expressar sua opinião por um ou outro candidato está liberado, mas caberá o direito de resposta e a proibição do anonimato em artigos e reportagens. Ufa!, sobre o anonimato não preciso temer, mas será que algum dos 350 (estou sendo bonzinho hoje) apadrinhados do Sarney em empresas do governo vão querer direito de resposta por eu já tê-lo criticado por aqui?

Como afirmou o Xexéo outro dia no programa da CBN "Liberdade de Expressão" (atentem para esta expressão, senhores), parece que nossa classe política ainda não sabe lidar bem com a internet. Vejamos: caso a emenda seja aprovada, os sites jornalísticos continuarão proibidos de “dar tratamento privilegiado a candidato, partido ou coligação, sem motivo jornalístico que justifique”. Que tipo de privilégios a proposta se refere? E o quê um fato político precisa para virar “motivo jornalístico”, no entender dos nobres deputados?

Adiante: direito de resposta para blogs?!?! Ora, os blogs estão entre os meios mais democráticos da internet, pois o "direito de resposta" já é algo inerente a eles, na ideia dos comentários que qualquer leitor pode fazer após a leitura das postagens. É isso que torna a internet 2.0 única. Aqui, o leitor também tem vez: cada post tem espaço para comentários, elogios, críticas, "direitos de resposta" etc. E há também a flexibilidade: podemos sempre "corrigir" textos já escritos, acrecentando algo ou cortando eventuais tropeços. Quando um blog obstrui a participação/interação do internauta, aí sim, deixa-nos em dúvida se é realmente um blog, como é o caso do recente Blog do Planalto.

Sobre este blog, já apelidado o "blog do Lula", fica difícil levá-lo à sério após constatarmos que ele não permite comentários após as postagens. Ou seja, é um monólogo, uma via de mão única à qual o leitor internauta não foi convidado a manifestar-se e exercer seu direito de cidadão, apenas ler (ou, no máximo, clicar num ridículo "gostou ou não gostou?" após o post. Longe de resignarem-se, internautas mais atentos já criaram um "clone" do Blog do Planalto, à sua imagem e semelhança. A única diferença, muito importante, é que ali os comentários são liberados.

Enquanto isso, a imprensa vem sofrendo mais perseguições no Brasil e América do Sul. Enquanto aqui temos a censura ao jornal Estado de São Paulo, impedido de denunciar um esquema de corrupção envolvendo o filho de Sarney (olha ele aí de novo), na Venezuela, Chavez (que já fechou uma TV bastante popular) ameaça com o fim da concessão pública inúmeras rádios e TVs locais. E como se não bastasse, semana passada a redação do jornal Clarín, um dos mais críticos ao governo de Cristina Kirchner, foi invadida por um grupo de agentes da AFIP a Receita Federal argentina), sob a acusação de "problemas com a receita federal". Ora, por que dona Cristina não mandou que invadissem as mansões dos ricos argentinos que sonegam impostos?

Aliás, é interessante notar a cara de pau destes políticos ao tentarem explicar o incontornável: na Argentina, madame Kirchner afirmou que nunca houve tanta liberdade de expressão como agora. No entanto, a invasão à redação do Clarín, coincidentemente, se deu no mesmo dia em que o jornal denuciou irregularidades na entrega de um subsídio de US$ 2,5 milhões a uma empresa por um órgão estatal ligado à AFIP. No Brasil, Sarney foi a tribuna do Senado declarar que os parlamentares - e não a imprensa - seriam os "legítimos representantes do povo", porque, eles sim, "agem às claras". Bom, no caso específico do presidente do senado, não parece ter sido este o caso ao nomear secretamente uma infinidade de parentes, namorados de netas, mordomos, amigos de amigos...

Em algum lugar, longe deste Brasil pândego de hoje, Aparício Torelly deve estar rindo a valer com essas situações absurdas e dando graças a Deus por já ter morrido. Por enquanto, resta-nos lutar sempre contra estes desmandos da classe política e as novas formas disfarçadas (ou não) de censura aos meios de comunicação. Caso contrário, como diria o Barão de Itararé, de onde menos se espera...daí é que não sai nada mesmo.