sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Cobertura das Olimpíadas - quando o interesse comercial chega em primeiro

Eu gostaria de começar essa postagem assim:

O Brasil inteiro está na expectativa da abertura dos jogos olímpicos, pela primeira vez sendo disputados na América do Sul. A população aguarda ansiosamente pela maior abertura de um evento esportivo de todos os tempos, cujas competições certamente estarão entre as maiores da história. A passagem da tocha olímpica inflou os ânimos ufanistas do povo brasileiro, que fez questão de acompanhá-la por mais de 300 cidades nos quatro cantos do país. Nesta sexta, a apoteose dos jogos olímpicos modernos tem início, com transmissão televisiva para todo o planeta. Todos os jogos, dentre todos os esportes, serão transmitidos pelas TVs aberta e a cabo, e a expectativa é grande.

Notou algo errado com o parágrafo acima? Pois é mais ou menos como o comitê olímpico brasileiro - e grande parte dos veículos de comunicação, como a TV Globo - vêm se referindo aos jogos olímpicos. Um misto de patriotismo, ufanismo e emoção que pode servir para inflar a audiência., mas que desde já sabemos quem perde:o jornalismo.  

Não precisa estar sintonizado na TV. Uma checada em dois dos maiores portais da internet, G1 e UOL, na quinta de manhã, sinaliza o contraste entre, pelo menos ali, quem apostava na informação correta e quem aposta na emoção Vejamos as principais manchetes em torno das 10 da manhã desta quinta-feira, véspera dos jogos:

UOL: "Na véspera da Olimpíada, crise na Rio-2016 afeta organização dos jogos"

G1 "Em cadeira de rodas, Zagallo recebe tocha de Parreira e emociona"
Subtítulo: Na internet, muitos lembram que 'chama olímpica' tem 13 letras, número da sorte do ex-técnico campeão do mundo

Enquanto o portal UOL aponta uma possível crise na organização do evento (indo ao fatos), o portal concorrente aposta na emoção. Hoje mesmo, na sexta, algumas horas antes do início do evento, vejo um anúncio na TV Globo: imagens de atletas se superando. comemorando, chorando etc. Ao fundo a trilha sonora: "Emoções", de Roberto Carlos.

Na disciplina específica do jornalismo esportivo, alunos que querem seguir carreira na área são advertidos pelos professores que na cobertura de jogos é permitido um viés mais emocional. Concordo. Lembro de Nelson Rodrigues, ao reclamar dos idiotas da objetividade, os quais, segundo ele, teriam abolido o ponto de exclamação das manchetes. O cronista reclamava ironicamente que quando o Brasil se sagrasse campeão mundial de futebol a manchete viria tal qual um manifesto fúnebre...

Mas há que se encontrar um meio termo. E isso é difícil para aqueles veículos cujos anunciantes investem milhões em propaganda. E estes anunciantes querem retorno, querem audiência. Quanto mais gente assistindo aos jogos, melhor. Para os anunciantes, para os canais de TV, para os portais da internet...mas não para aquela parte do público que prefere ser bem informado (e se emocionar com os jogos, por que não?) a ter sua telinha invadida por mensagens propagandísticas para vender produtos enquanto passam os jogos.

Está para ser contada a outra história do périplo da tocha olímpica ao longo dos 98 dias e quase 300 cidades pelo território brasileiro. Enquanto na TV era só alegria, a realidade era outra, com manifestações em várias capitais contra o governo, protestos contra a Globo, gente querendo apagar a chama das tochas, eventos de apoio cancelados por medo de tumulto e até uma onça morta.

Bem, talvez após os jogos. Enquanto isso, uma boa olimpíada para os atletas brasileiros. E para todos nós.
   















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